Cientistas modificam fêmeas para realizarem “partos virgens” sem a contribuição de machos

Por , em 30.07.2023
Um cromossomo gigante da mosca-da-fruta Drosophila melanogaster, que foi bioengenheirado para se reproduzir assexuadamente. Crédito: Robert Markus/SPL.

Cientistas alcançaram uma conquista revolucionária na engenharia genética ao possibilitar o “nascimento virgem” em animais fêmeas que normalmente necessitam de um parceiro macho para se reproduzir. Enquanto pesquisas anteriores haviam gerado ratos e sapos jovens sem qualquer contribuição genética do pai, este estudo foi um passo adiante, conferindo às fêmeas a capacidade de passar por partenogênese, ou nascimento virgem.

A equipe de pesquisadores, liderada por Alexis Sperling da Universidade de Cambridge, Reino Unido, identificou e confirmou a função de genes candidatos responsáveis pela partenogênese. A partenogênese é uma forma natural de reprodução presente em algumas espécies de insetos, lagartos e outros animais, em que a prole pode ser gerada sem a necessidade de contribuição genética de um macho.

Os pesquisadores sequenciaram os genomas de duas linhagens da mosca Drosophila mercatorum: uma que se reproduz sexualmente e outra que passa pela partenogênese. Ao comparar a atividade dos genes nos ovos de ambas as linhagens, eles identificaram 44 genes potenciais envolvidos na partenogênese. Para confirmar sua função, eles modificaram genes equivalentes na mosca-da-fruta Drosophila melanogaster, uma espécie que normalmente não se reproduz assexuadamente.

Após várias tentativas, descobriram uma combinação de genes alterados que induziu a partenogênese em cerca de 11% das fêmeas de moscas-da-fruta. Curiosamente, algumas das proles dessas moscas geneticamente modificadas apresentaram três conjuntos de cromossomos, ao contrário dos ovos típicos produzidos pela partenogênese, que possuem apenas dois conjuntos.

A partenogênese é considerada uma forma altamente eficiente de reprodução, e estudá-la ajuda os pesquisadores a compreender as complexidades e vantagens associadas à reprodução sexual. Além disso, a pesquisa pode fornecer informações sobre a evolução da própria partenogênese. Compreender a base genética dessa estratégia reprodutiva em moscas, como feito neste estudo, pode levar a insights sobre a evolução desse comportamento em outras espécies.

A mosca fêmea Drosophila mercatorum pode se reproduzir sem a contribuição de um macho. Crédito: Encenação por Jose Casal, Fotografia por Peter Lawrence.

Além disso, as descobertas do estudo têm implicações práticas, já que algumas pragas agrícolas dependem da partenogênese para se multiplicarem rapidamente e causarem danos às lavouras. Ao entender os gatilhos que levam as pragas a adotar essa estratégia reprodutiva, os cientistas esperam desenvolver estratégias eficazes de controle para reduzir suas populações e mitigar os danos causados por essas pragas.

Além de representar uma conquista notável na área da genética, a pesquisa sobre a partenogênese pode ter importantes implicações para a conservação da biodiversidade e o manejo de espécies ameaçadas. Compreender os mecanismos genéticos que possibilitam a reprodução sem a necessidade de parceiros pode ajudar os cientistas a desenvolver estratégias para aumentar a taxa de reprodução em populações de animais em risco de extinção.

Por exemplo, em situações em que é difícil ou inviável manter um número adequado de parceiros reprodutivos para uma determinada espécie em cativeiro, a manipulação genética poderia oferecer uma alternativa viável para estimular a reprodução. Isso poderia garantir a diversidade genética necessária para a sobrevivência a longo prazo da espécie, evitando problemas associados à endogamia.

Além disso, compreender os fatores que desencadeiam a transição de reprodução sexual para partenogênese em algumas pragas agrícolas pode levar ao desenvolvimento de novas estratégias de controle de pestes. Ao identificar esses fatores e interferir na expressão dos genes envolvidos, é possível direcionar o comportamento reprodutivo dessas pragas para limitar sua proliferação, minimizando os danos às colheitas.

Embora a partenogênese seja um fenômeno natural fascinante, é importante lembrar que a pesquisa em engenharia genética requer rigor ético e cautela. A aplicação responsável dessa tecnologia deve considerar possíveis impactos ambientais e garantir a segurança dos organismos modificados e do ecossistema como um todo.

Em suma, os avanços na manipulação genética para induzir a partenogênese em animais abrem novas perspectivas para a ciência, desde a compreensão da evolução e diversificação das espécies até aplicações práticas na conservação da biodiversidade e no manejo de pragas agrícolas. [Nature]

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