Pandemias ainda piores estão por vir se não pararmos com esse péssimo hábito, alertam os principais cientistas do mundo

Por , em 28.04.2020

Os principais especialistas em biodiversidade do mundo fizeram um alerta: a pandemia atual de coronavírus pode ser seguida por outra ainda mais mortal, caso não lidemos com a raiz do problema.

E qual a raiz do problema? A nossa destruição desenfreada da natureza.

“Há uma única espécie responsável pela pandemia de Covid-19 – nós. Epidemias recentes são uma consequência direta da atividade humana, particularmente dos nossos sistemas financeiros e econômicos globais que priorizam crescimento econômico a qualquer custo. Temos uma pequena janela de oportunidade para superar os desafios da crise atual e evitar semear novas”, disseram Josef Settele, Sandra Díaz, Eduardo Brondizio e Peter Daszak, no relatório encomendado pela Plataforma Intergovernamental de Políticas Científicas sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (IBPES).

“Fazer negócios como sempre não funcionará. Agora, como são, esses negócios são pandemias esperando para acontecer e rezando para haver uma vacina. Essa não é uma boa estratégia. Precisamos lidar com as causas subjacentes”, reforçou Daszak.

O relatório

A IPBES foi criada em abril de 2012 com o objetivo de informar os governos sobre o estado da biodiversidade, ecossistemas e serviços prestados, reforçando a interface ciência/política. A plataforma também disponibiliza informações para o aprimoramento de políticas e de estratégias setoriais em favor da conservação e uso sustentável da natureza, do bem-estar humano e do desenvolvimento sustentável.

Em 2019, Josef Settele, Sandra Díaz e Eduardo Brondizio conduziram a avaliação mais abrangente já feita da saúde do planeta para o IPBES. O estudo concluiu que a sociedade humana estava em perigo devido ao declínio acelerado dos sistemas naturais de suporte à vida na Terra.

Este ano, com a adição do Dr. Peter Daszak, o novo relatório indicou que o “desmatamento desenfreado, a expansão descontrolada da agricultura, a agricultura intensiva, a mineração e o desenvolvimento de infraestrutura, bem como a exploração de espécies selvagens criaram uma ‘tempestade perfeita’ para a propagação de doenças”.

Como essas atividades causam pandemias?

Essas atividades causam pandemias ao trazer mais pessoas em contato e conflito com animais, a partir dos quais se originam 70% das doenças humanas emergentes.

Esse fator, combinado com a urbanização e o crescimento explosivo da viagem área global, foi o que permitiu que um vírus provavelmente originado de um morcego asiático levasse sofrimento e parasse a economia e a sociedade no mundo todo.

O que é pior é que o Covid-19 pode ser apenas o começo. “É provável que pandemias futuras ocorram com mais frequência, se espalhem mais rapidamente, tenham maior impacto econômico e matem mais pessoas se não tomarmos muito cuidado com os possíveis impactos das escolhas que fazemos hoje”, destacaram os cientistas.

Custos econômicos: proteger a natureza versus controlar pandemias

De acordo com os especialistas, os pacotes de recuperação multitrilionários sendo lançados pelos governos para recuperação da economia deveriam ser usados para fortalecer e fiscalizar proteção ambiental.

“Pode ser politicamente conveniente relaxar os padrões ambientais e apoiar setores como agricultura intensiva, companhias aéreas e setores de energia dependentes de combustíveis fósseis, mas fazê-lo sem exigir mudanças urgentes e fundamentais subsidia essencialmente o surgimento de futuras pandemias”, esclareceram.

Além disso, programas de vigilância e serviços de saúde precisam ser adequadamente financiados nos países na linha de frente do risco de pandemias.

Dado que a saúde das pessoas está intimamente conectada com a saúde da vida selvagem e do meio ambiente, tudo deve ser considerado uma coisa só. “Isso não é simples altruísmo – é um investimento vital no interesse de todos para evitar futuros surtos globais”, enfatizaram.

Se um incentivo financeiro for necessário, ele também existe: “Os programas de que estamos falando custarão dezenas de bilhões de dólares por ano. Mas se você tem uma pandemia, mesmo que seja apenas uma por século, que custa trilhões, então você ainda obtém um retorno incrivelmente bom sobre o investimento”, argumentou Daszak.

Uma coisa só

Em resumo, os cientistas creem que podemos sair dessa crise mais fortes e resistentes do que nunca, “escolhendo ações que protejam a natureza, para que a natureza possa ajudar a nos proteger”.

É como disse o chefe de meio ambiente da ONU, Inger Andersen, em março: “A natureza está nos enviando uma mensagem com a pandemia de coronavírus e a atual crise climática. Ela nos disse que deixar de cuidar do planeta significa não cuidar de nós mesmos”.

Leia o relatório (em inglês) aqui.[TheGuardian]

1 comentário

  • Abrahan Nipah:

    Eu só poderia concordar mais se o uso do termo “nós”, não fosse tão irresponsável…

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