Bactéria criada em laboratório produz substâncias que tratam espinhas

Por , em 11.01.2024

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Um estudo internacional conduzido pelo Laboratório de Biologia Sintética Translacional do Departamento de Medicina e Ciências da Vida (MELIS) da Universidade Pompeu Fabra logrou um avanço significativo no aprimoramento genético do Cutibacterium acnes, um microrganismo habitual na pele. Esta modificação genética possibilita a produção de uma substância terapêutica eficaz no tratamento dos sintomas da acne.

Esse micróbio modificado foi testado com sucesso em culturas de células da pele e sua eficácia foi comprovada em experimentos com camundongos. Este avanço representa um marco no desenvolvimento de novas técnicas para a modificação genética de bactérias dificilmente manipuláveis, visando o tratamento de doenças da pele e outras enfermidades por meio de agentes terapêuticos vivos.

Conforme publicado na revista Nature Biotechnology, os cientistas conseguiram alterar o DNA do Cutibacterium acnes para que ele gerasse e liberasse a proteína NGAL. Essa proteína é essencial na eficácia do medicamento para acne isotretinoina, conhecido por reduzir a produção de sebo através da promoção da morte dos sebócitos.

A equipe de pesquisa inclui especialistas de várias instituições, como o Instituto de Pesquisa Biomédica de Bellvitge (Idibell), a Universidade de Barcelona, o Centro de Regulação Genômica, a Phenocell SAS, a Medizinische Hochschule Brandenburg Theodor Fontane, a Universidade de Lund e a Universidade de Aarhus.

A acne, um problema de pele comum, surge do bloqueio ou inflamação dos folículos pilossebáceos. Ela pode se manifestar de várias formas, incluindo cravos, espinhas, pústulas e nódulos, principalmente no rosto, testa, peito, costas superiores e ombros. Embora seja mais prevalente entre adolescentes, pode afetar pessoas de todas as idades.

Nos casos mais graves de acne, geralmente são utilizados antibióticos para eliminar as bactérias presentes nos folículos ou a isotretinoina (Accutane), um derivado da vitamina A que induz a morte dos sebócitos. Contudo, esses tratamentos podem ter efeitos colaterais significativos, incluindo desequilíbrio da microbiota da pele e aumento da sensibilidade à luz no caso de antibióticos, defeitos congênitos e descamação severa da pele com isotretinoina.

Nastassia Knödlseder, a principal autora do estudo, declara: “Desenvolvemos uma terapia tópica com uma abordagem direcionada, aproveitando mecanismos naturais. Adaptamos uma bactéria que habita a pele para produzir o que nossa pele necessita. Embora o foco atual seja o tratamento da acne, este método tem potencial para diversas outras aplicações.”

Desafios na engenharia de bactérias

“Até então, C. acnes era visto como uma bactéria difícil de manipular. Introduzir DNA e conseguir a produção ou secreção de proteínas a partir de elementos genéticos inseridos era um grande desafio,” explica Knödlseder, pesquisadora pós-doutorado no Laboratório de Biologia Sintética Translacional da UPF.

No entanto, devido à sua posição única nos folículos capilares, próximo de onde o sebo é liberado, seu papel na manutenção do equilíbrio da pele, sua proximidade com alvos terapêuticos relevantes e sua capacidade comprovada de enxerto na pele humana, a equipe persistiu na edição do DNA dessa bactéria anteriormente inalterável.

A equipe, liderada por Marc Güell, focou em aprimorar a transferência de DNA para a célula, estabilizar o DNA dentro da célula e na expressão gênica. Eles também desenvolveram uma estratégia de biocontenção para enfrentar preocupações regulatórias, evitando o uso de elementos potencialmente problemáticos como elementos genéticos móveis, plasmídeos ou resistência a antibióticos. Isso garante que a bactéria modificada seja segura para uso prático e como potencial terapêutico humano.

O C. acnes sintético é capaz de secretar e produzir NGAL, influenciando a produção de sebo em linhas celulares. Em camundongos, o único modelo disponível para testar tais bactérias, esses micróbios modificados se enxertam, sobrevivem e produzem a proteína. No entanto, a pele de camundongo difere significativamente da humana, necessitando de modelos alternativos como modelos de pele 3D para testes mais precisos.

Potencial terapêutico futuro

“Criamos uma plataforma tecnológica que permite a modificação de qualquer bactéria para tratar uma variedade de doenças. Atualmente, estamos nos concentrando em usar o C. acnes para combater a acne, mas nossa técnica pode ser adaptada para criar micróbios inteligentes para detecção cutânea ou modulação imunológica,” diz Güell.

Seguindo essa abordagem, pesquisas adicionais sob o Projeto Europeu “SkinDev” envolverão o Laboratório de Biologia Sintética Translacional e seus parceiros na engenharia do C. acnes para enfrentar a dermatite atópica, uma condição cutânea crônica caracterizada por pele seca, eczema e coceira intensa, comum especialmente em crianças pequenas.

Embora cada abordagem de terapêutica viva deva passar por validação individual, os pesquisadores estão otimistas quanto à aplicação desses micróbios inteligentes em humanos, dado o uso seguro e eficaz do C. acnes não modificado na pele de pacientes. [Phys]

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