Edição do Epigenoma: Desafios Éticos e Terapêuticos

Por , em 6.11.2023

A edição do epigenoma é uma tecnologia emergente que permite controlar a função genética manipulando os estados epigenéticos em locais específicos do genoma. Esse método difere da edição genética tradicional, pois não envolve alterações permanentes na sequência de DNA. Importante destacar que os efeitos da edição do epigenoma são considerados reversíveis, tornando-a uma ferramenta atraente para possíveis aplicações terapêuticas no tratamento de doenças genéticas e crônicas.

Embora alguns pesquisadores argumentem que a edição do epigenoma apresenta menos preocupações éticas em comparação com a edição genética permanente, especialmente no que diz respeito ao impacto nas gerações futuras, existe a possibilidade de herança epigenética transgeracional, na qual as alterações epigenéticas podem ser transmitidas ao longo das gerações em mamíferos.

Um estudo recente publicado na revista Stem Cell Reports teve como objetivo explorar os aspectos éticos e práticos do uso da edição do epigenoma para fins terapêuticos, especialmente no contexto da herança epigenética transgeracional e suas potenciais implicações para as gerações futuras.

O epigenoma consiste em modificações químicas no genoma que regulam a expressão genética. A edição do epigenoma possui um grande potencial para tratar distúrbios genéticos e doenças crônicas, modificando a função do genoma, principalmente a expressão gênica, sem alterar a sequência de DNA. Esse processo envolve vários mecanismos moleculares, incluindo metilação de DNA, modificações nas histonas, RNAs não codificadores, estrutura da cromatina e ligação de fatores de transcrição. No entanto, interrupções nesses mecanismos podem levar a distúrbios genéticos e câncer.

O estudo discute duas categorias de edição do epigenoma: a edição “somente no local”, que tem efeitos temporários que podem ser facilmente revertidos, e a edição “formadora de memória”, que induz alterações epigenéticas persistentes mesmo após a remoção da ferramenta de edição. Esta última categoria apresenta desafios relacionados à possível irreversibilidade, semelhante à edição genômica.

O germline, que consiste no material genético transmitido à prole, é uma preocupação particular ao considerar a herança transgeracional. Embora as aplicações do epigenoma no germline ainda não tenham sido documentadas, o estudo explora cenários teóricos nos quais isso poderia afetar as linhagens de células germinativas, como em fetos pré-natais e bebês pós-natais, estabelecendo paralelos com as preocupações éticas associadas à edição genética hereditária, especialmente em embriões humanos para fins clínicos.

Outra preocupação é a possibilidade de efeitos fora do alvo na edição do epigenoma, que podem resultar em alterações não intencionais em todo o genoma. Esses efeitos fora do alvo podem ter consequências de longo prazo, especialmente em casos de edição do epigenoma formadora de memória. Além disso, avaliar os resultados dos efeitos epigenéticos pode ser mais desafiador do que avaliar as alterações genéticas.

Embora a herança epigenética transgeracional tenha sido observada em organismos como leveduras, plantas e nematóides, ainda não está claro se esse fenômeno ocorre em mamíferos. De forma crucial, as alterações epigenéticas também podem ocorrer em resposta a fatores ambientais e serem transmitidas ao longo das gerações em alguns organismos.

Os autores argumentam que, se esse fenômeno for realmente presente em mamíferos, pode ser prematuro concluir que a edição do epigenoma inherentemente levanta menos preocupações éticas do que a edição genômica tradicional. Portanto, há uma necessidade urgente de discussões mais abrangentes sobre a ética e a regulamentação das aplicações clínicas da edição do epigenoma em seres humanos.

Considerando a possibilidade de herança epigenômica transgeracional, os autores argumentam que as discussões éticas e as considerações regulatórias relacionadas à edição do epigenoma não devem desconsiderar seus aspectos hereditários. Cada aplicação da edição do epigenoma deve passar por uma avaliação minuciosa, levando em consideração os efeitos epigenéticos específicos envolvidos, sua persistência e o método de entrega. No entanto, avaliar a segurança dessas aplicações e seu impacto nas gerações futuras apresenta desafios significativos.

Para enfrentar esses desafios, os autores propõem três critérios para avaliar a validade do uso da edição do epigenoma em humanos no tratamento de doenças: a seletividade da intervenção para tecidos ou células-alvo, a possibilidade de efeitos diretos no germline e a gravidade dos sintomas da doença.

Embora as intervenções epigenômicas hereditárias possam parecer promissoras para evitar a transmissão de doenças à prole, elas levantam preocupações éticas em curso sobre seu impacto nas gerações futuras, semelhantes à edição genômica hereditária. Portanto, os autores defendem o estabelecimento de regulamentações rigorosas semelhantes às que governam a edição genômica e a terapia genética, especialmente para futuras edições epigenômicas hereditárias e intervenções embrionárias. Essa recomendação destaca a necessidade de uma gestão cuidadosa da edição do epigenoma para garantir sua aplicação ética e segura na área clínica.

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