Nem todo mundo entende sarcasmo e isso pode dizer muito sobre o nosso cérebro

Por , em 22.06.2015
** FILE ** In this Oct. 8, 2008 file photo, host Jon Stewart gestures during a taping of "The Daily Show with Jon Stewart" in New York. (AP Photo/Evan Agostini, file)

Sarcasmo. Todos nós o usamos, ficamos ocasionalmente furiosos com ele e perplexos quando as pessoas não o entendem. Porém, segure a raiva dentro de você quando encontrar um Sheldon Cooper para chamar de seu: esta é uma forma incrivelmente complicada de comunicação, e nos diz muito sobre como nos comunicamos e como nossos cérebros funcionam.

O sarcasmo faz mais do que aparições ocasionais em nossos cotidianos. Ele é tão comum que aqueles que têm dificuldade entendê-lo se destacam imediatamente na multidão como pessoas que têm dificuldades com relações interpessoais e comunicação. Ele tem se tornado tão importante que o linguista John Haiman, da Macalester College, em Minnesota, nos Estados Unidos, chegou a afirmar que este é o próximo estágio de evolução para a linguagem.

Usá-lo – e entendê-lo – tem um impacto mensurável sobre como nossos cérebros funcionam. Quando os pesquisadores monitoraram a atividade elétrica nos cérebros de pessoas expostas a sarcasmo, eles descobriram que a atividade não só aumentou, mas o nosso cérebro precisa trabalhar mais para captar o conceito de sarcasmo e decidir o que um comentário que realmente significa.

Sarcasmo nos deixa mais espertos?

Essa figura de estilo tem algumas consequências impressionantes. Um estudo israelense sobre o sarcasmo descobriu que estudantes tentando resolver problemas se saiam comprovadamente melhor quando as reclamações e questões eram apresentadas a eles de uma maneira que era sarcástica, ao contrário de apenas raivosa.

A incapacidade de compreender sarcasmo também tem sido associada a danos cerebrais – especificamente, danos no lobo pré-frontal de uma pessoa. Pesquisas realizadas na Universidade de Haifa, em Israel, pela psicóloga Simone Shamay-Tsoory e sua equipe, selecionaram voluntários com e sem dano cerebral e monitoravam como eles reagiram a declarações sarcásticas. Aqueles com cérebros saudáveis conseguiam compreender o sarcasmo sem problema, e aqueles com danos a outras partes do cérebro que não o lobo pré-frontal também não tiveram dificuldades em entendê-lo.

Os pesquisadores descobriram, ainda, que a incapacidade de entender sarcasmo tem outros efeitos também. Não ser capaz de entender se uma declaração é literal ou não espelha certos comportamentos sociais muitas vezes ligados a um diagnóstico de autismo.

Risco calculado

Há também uma coisa estranha que acontece quando analisamos quando, onde e com que frequência o sarcasmo é usado. Conversando com os amigos? É muito utilizado. Falando com estranhos? Não muito. Falando com estranhos online? Nunca é utilizado. (Brincadeirinha – é usado o tempo todo).

E isso, de acordo com Jeffrey Hancock, professor de Comunicação da Universidade de Cornell, nos EUA, diz muito sobre a nossa bravura quando se trata de dizer algo que poderia ser tomado como bastante contundente. Ou seja, nós ficamos mais do que felizes em fazê-lo quando há a proteção de um computador entre aquele produzindo o sarcasmo e o seu receptor.

Tudo tem hora e lugar

Mas sarcasmo online ou o seu papel pode ter algumas consequências de longo alcance sobre as quais estamos começando a aprender. Todos os anos, por volta do Natal, o “British Medical Journal” publica uma edição com estudos hilários e cheios de sarcasmo. Os estudos são reais, os dados são reais, mas eles são não convencionais. Exemplos recentes incluem um artigo sobre o poder da oração na cura, e outro que diz que os homens morrem mais cedo do que as mulheres porque são mais propensos a fazer coisas estúpidas.

O problema vem depois, quando os estudos são arquivados na internet ao lado de todos os outros artigos da revista, quando são pesquisados, acessados ​​e lidos sem o entendimento de que eles foram originalmente concebidos como parte de uma antologia da ciência sarcástica. A BBC já fez uma reportagem baseada em uma destas paródias de artigos e o mesmo artigo também já foi destaque em livros sobre o cérebro masculino.

Este tipo de abordagem está gerando comoção na comunidade científica não só por ser um pouco elitista, mas também porque cria toda uma nova gama de informações que é suscetível de ser tirada do contexto e citada de maneira inadequada, com outras pessoas querendo saber o quão ética é a ciência sarcástica.

Um exemplo mais próximo de nós são sites de notícias falsas, como o internacional “The Onion” ou os brasileiríssimos “Sensacionalista” e “The Piauí Herald”. Apesar dos nomes destes veículos serem bastante suspeitos e os artigos conterem enormes avisos de que aquelas notícias não têm compromisso algum com a verdade, todo mundo tem uma tia que já acreditou em um desses. No caso do jornalismo, nós estamos mais acostumados ao formato e a mensagem sarcástica fica mais clara, mas artigos científicos sarcásticos são menos comuns e, por isso mesmo, causam confusão mais facilmente, mesmo entre aqueles do meio. [Knowledge Nuts, Smithstonian Magazine, The Guardian, The Atlantic]

1 comentário

  • Cesar Grossmann:

    Os japoneses tem uma versão menos ácida, você tem que “ler o clima” da situação, e reagir de acordo. Sem falar nas 3.000 regras sociais…

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