Observação inédita do decaimento de um bóson de Higgs em um par de quarks bottom

Por , em 5.09.2018

Físicos que trabalham no Grande Colisor de Hádrons (LHC, na sigla em inglês) fizeram a primeira observação inequívoca do decaimento do bóson de Higgs em um par matéria-antimatéria de quarks.

O anúncio mostra uma forte concordância entre as previsões teóricas e os dados experimentais.

Isso pode ajudar os cientistas a explicar ideias fundamentais na física de partículas, por exemplo, por que o bóson de Higgs existe em primeiro lugar.

Bóson de Higgs e seus possíveis decaimentos

Os bósons de Higgs são criados em colisões de alta energia entre pares de partículas aceleradas até quase a velocidade da luz. Esses bósons não vivem por muito tempo: apenas 1.0 × 10-22 segundos. Uma partícula com essa vida, viajando à velocidade da luz, decairá muito antes de percorrer uma distância do tamanho de um átomo.

Assim, é impossível observar diretamente os bósons de Higgs. Só é possível observar os produtos de seus decaimentos e usá-los para inferir as propriedades da partícula “original”.

Os bósons de Higgs têm uma massa de 125 gigaelétron-volts (GeV), o que é cerca de 133 vezes mais pesado que um próton. Cálculos predizem que os bósons de Higgs decompõem-se em pares das seguintes partículas nas seguintes porcentagens: quarks bottom (58%), bósons W (21%), bósons Z (6%), léptons tau (2,6%) e fótons (0,2%). Configurações mais exóticas compõem o restante.

Um dos principais resultados do anúncio mais recente foi verificar se a previsão estava correta para quarks bottom.

Quarks bottom

Quando os físicos anunciaram a descoberta do bóson de Higgs em 2012, eles detectaram seu decaimento em bósons Z, bósons W e fótons, mas não em quarks. A razão é extremamente simples: esses decaimentos específicos são muito mais fáceis de identificar.

Nas energias de colisão disponíveis no LHC, bósons de Higgs são feitos em apenas uma colisão em cada 1 bilhão. Um grande número dessas colisões ocorre através da interação da força nuclear forte. O problema é que, nas interações que envolvem a força forte, a produção de um par matéria-antimatéria de quarks bottom é bastante comum. Assim, a produção que vem dos bósons de Higgs decaindo em quarks bottom fica “perdida” no meio de pares de quarks bottom feitos por processos mais comuns, como uma agulha no palheiro.

Como é difícil ou impossível isolar as colisões nas quais bósons de Higgs decaem em quarks bottom, os cientistas precisavam de outra abordagem. Assim, decidiram procurar em uma classe diferente de eventos – colisões em que um bóson de Higgs foi produzido ao mesmo tempo que um bóson W ou Z. Os pesquisadores chamam essa classe de colisões de “produção associada”.

Produção associada

Os bósons W e Z são responsáveis por causar a força nuclear fraca e podem decair de maneiras distintas e facilmente identificáveis.

Esse tipo de produção associada ocorre com menos frequência do que a não associada, mas a presença de bósons W ou Z aumenta muito a capacidade dos pesquisadores de identificar eventos contendo um bóson de Higgs.

A técnica de produção associada de um bóson de Higgs foi pioneira no Fermilab, laboratório especializado em física de partículas de alta energia do Departamento de Energia dos Estados Unidos. Por causa do acelerador de partículas de baixa energia da instalação, o laboratório nunca foi capaz de afirmar que havia descoberto o bóson de Higgs, mas o conhecimento de seus pesquisadores desempenhou um papel significativo no anúncio do LHC.

Concordância

O LHC hospeda dois detectores de partículas grandes capazes de observar os bósons de Higgs: os experimentos CMS (Compact Muon Solenoid) e ATLAS (A Toroidal LHC Apparatus).

Ambas as colaborações experimentais anunciaram a observação da produção associada de bósons de Higgs, com o decaimento específico dos bósons em um par matéria-antimatéria de quarks bottom.

Embora a simples observação desse modo de decaimento seja um avanço significativo no conhecimento científico, ele tem uma implicação mais importante.

O campo de Higgs, proposto em 1964, não é motivado por uma ideia fundamental na física. Ele foi simplesmente “adicionado” ao Modelo Padrão, que descreve o comportamento de partículas subatômicas. Antes dele, o Modelo Padrão previa partículas sem massa. Depois que o campo de Higgs foi incluído, partículas agora têm massa. Assim, é muito importante explorar previsões e probabilidades de decaimento para procurar uma conexão com uma teoria subjacente.

Em outras palavras, é crucial entender a taxa na qual os bósons de Higgs decaem em outras partículas e compará-las com as taxas de decaimento previstas. Uma melhor concordância entre previsão e realidade produzirá uma razão próxima a 1. O experimento CMS teve excelente concordância, com uma proporção de taxas previstas para observadas de 1,04, com margem de erro de 0,20. A medição ATLAS teve concordância similar: 1,01 com margem de erro 0,20.

Mais surpresas

O LHC continuará operando até o início de dezembro. Em seguida, interromperá as operações por dois anos para atualizações.

Na primavera de 2021, o colisor retomará as operações com capacidades consideravelmente aprimoradas. Espera-se que seus detectores continuem a coletar dados até meados da década de 2030 e registrem mais de 30 vezes mais informações do que até agora.

Com esse aumento de dados e capacidades, é bem possível que o bóson de Higgs ainda surpreenda bastante os cientistas. [LiveScience]

2 comentários

  • Alberto Carvalhal Campos:

    O LHC não é indicado para detectar o boson de higgs. Ele é um esmagador de prótons. Para que serve esmagar prótons? Antes de surgir o universo, não existiam os prótons. Não existia nada e foi deste nada (energia) que surgiu o tudo (matéria). Chocar prótons não significa nada.

    • Cesar Grossmann:

      Alberto, se você ler a teoria por trás do uso do LHC para encontrar o Bóson de Higgs, vai ver que faz sentido perfeitamente. Chocar prótons a altas velocidades (implicando altas energias) gera uma infinidade de partículas subatômicas, entre elas o Bóson de Higgs.

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