Cientistas “copiam e colam” medo de uma memória em outra

Por , em 1.09.2014

Nós tendemos a pensar em nossas memórias como fontes seguras para recordar o que nos aconteceu no passado, mas a verdade é que muitos estudos revelaram que elas mudam com o tempo. Nossos cérebros editam constantemente nossas memórias, reorganizando eventos e mudando diálogos. Além disso, nossas memórias emocionais são muitas vezes influenciadas pelo modo como nos sentimos sobre esses eventos atualmente.

Estudando camundongos, cientistas descobriram que as memórias podem ser divididas em partes componentes – a parte emocional separada da parte factual – e que as emoções associadas com uma memória podem ser transferidas para uma memória totalmente diferente.

Roger Redondo, neurocientista do Instituto de Tecnologia de Massachussets, e sua equipe reuniram um grupo de amostra de camundongos geneticamente modificados. Os cérebros dos ratos foram projetados de modo que se um antibiótico conhecido como doxiciclina fosse removido de sua dieta, certos neurônios em seus cérebros expressariam uma proteína chamada canalrodopsina-2 (ChR2) que desencadeia a atividade neural em resposta à luz azul.

Este sistema permitiu que a equipe usasse a doxiciclina como uma espécie de botão “gravar/pausar” para a atividade neural. Os cientistas poderiam remover o antibiótico da dieta dos ratos, dar aos animais certos tipos de condicionamento, então voltar a dar-lhes a doxiciclina novamente. Isto criaria grupos de neurônios sensíveis à luz que haviam sido ativados durante períodos de tempo e tarefas específicas.

Modificando memórias

Os pesquisadores começaram seus experimentos removendo doxiciclina de dieta de seus ratos – apertando o botão “gravar” – e dando aos animais ou medo condicionado (na forma de um leve choque elétrico) ou recompensa condicionada (na forma de brincadeiras com uma rata).

A expressão da ChR2 deu sensibilidade à luz aos neurônios que haviam sido ativados durante essas atividades: em uma região do cérebro chamada hipocampo (para memórias de lugar) e em uma área chamada amígdala (para memórias de medo).

Após esta fase de condicionamento, os pesquisadores apertaram o botão de “pausa” no registro da atividade neural, o que garantiu que apenas memórias formadas durante o período de condicionamento pudessem ser reativadas pela luz azul.

A equipe, então, colocou os ratos em um local onde pudessem passear e provocaram seus neurônios sensíveis com luz azul, enquanto caminhavam através de certas áreas. Como você poderia esperar, os ratos condicionados ao medo fugiram da área quando suas memórias foram ativadas, enquanto camundongos condicionados à recompensa passaram mais tempo nessas áreas quando suas memórias felizes foram reativadas.

Até aí, nada novo – este tipo de experimento já havia sido feito antes. Porém, a equipe de estudiosos decidiu levar as coisas um passo adiante e descobrir se era possível vincular as memórias existentes de medo e recompensa com experiências completamente novas e diferentes. Assim, a equipe usou a luz para reativar memórias do medo nos ratos, desta vez, enquanto os bichos interagiam com uma fêmea.

Depois de nove dias deste condicionamento, os ratos ficaram aterrorizados com suas companheiras românticas. Ou seja, os pesquisadores essencialmente “copiaram e colaram” o medo da memória do choque nas memórias felizes dos ratos. Os resultados foram publicados na revista “Nature”.

Pedaços do passado

Esta pesquisa torna bastante claro que as memórias não são recordações absolutas. Elas podem ser divididas em partes, como locais e emoções, e cada uma dessas partes pode ser reativada de forma independente e até mesmo ligar-se a pedaços de memória completamente diferentes daqueles com as quais foram originalmente formados.

Redondo e sua equipe esperam que esta pesquisa possa nos ajudar a entender a formação de memórias desagradáveis e eventualmente ajudar no desenvolvimento de ferramentas clínicas para tornar lembranças ruins ​​menos dolorosas. [Discover Magazine]

Deixe seu comentário!