Descoberta câmara secreta com suposta obra “perdida” de Michelangelo

Por , em 25.04.2017
Monica Bietti, atual diretora do museu da Capela dos Médici, examina os esboços nas paredes da câmara enquanto segura um livro do trabalho de Michelangelo. Crédito: Paolo Woods/National Greographic

Em 1975, Paolo Dal Poggetto, então diretor do museu da Capela dos Médici, em Florença, tropeçou em um tesouro renascentista. Enquanto procurava uma nova saída para os turistas, Dal Poggetto e seus colegas descobriram um alçapão escondido debaixo de um guarda-roupa perto da Nova Sacristia, uma câmara projetada para abrigar as tumbas ornamentadas dos governantes da família Médici. Abaixo do alçapão, os degraus de pedra levavam a uma sala cheia de carvão que, a princípio, parecia ser pouco mais do que um espaço para guardar coisas que não estavam sendo usadas.

Mas, nas paredes, como relata a “National Geographic”, Dal Poggetto e seus colegas encontraram desenhos que acreditam ser carvão e de giz feitos pelo famoso artista Michelangelo. Apesar de a sala estar fechada ao público para proteger a obra de arte, o fotógrafo Paolo Woods, da NatGeo, teve acesso permitido para registar os desenhos.

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A obra de arte só está visível hoje porque Dal Poggetto não perdeu tempo quando entrou pela primeira vez na câmara. Como Florença é o lar de muitos dos grandes artistas renascentistas da história, ele suspeitava que algo valioso estivesse escondido embaixo das camadas de gesso. “Quando temos edifícios muito antigos, devemos prestar atenção”, diz Monica Bietti, sucessora de Dal Poggetto nas Capelas Médici, em entrevista à NatGeo.

Uma parede de câmara traz esses esboços de pernas em várias poses. Crédito: Paolo Woods/National Greographic

O esboço de membros sentados parece ser um estudo para a estátua de Giuliano de Médici, que fica no túmulo do governante na Nova Sacristia, acima da câmara escondida.

Camadas de história

Sob a direção de Dal Poggetto, os especialistas passaram semanas removendo meticulosamente o gesso com bisturis. Eventualmente, foram surgindo dezenas de desenhos, muitos deles reminiscentes de grandes obras de Michelangelo – incluindo o de uma escultura de mármore que adorna o túmulo de Giuliano de Médici na Nova Sacristia, logo acima da sala secreta, que também é de autoria do artista.

Dal Poggetto concluiu que o artista encontrou abrigo na câmara secreta durante aproximadamente dois meses em 1530 para se esconder da família Médici. Uma revolta popular havia enviado os governantes Médici da cidade para o exílio em 1527, e, apesar de terem sido mecenas de sua obra no passado, Michelangelo tinha traído a família, colaborando com outros florentinos contra o governo.

Um dos esboços de câmara parece ser uma imagem espelhada de um desenho de Michelangelo de Leda e o cisne, uma história popular da mitologia grega. Crédito: Paolo Woods/National Geographic

Com seu retorno ao poder alguns anos depois, a vida do artista de 55 anos estava em perigo. “Naturalmente, Michelangelo estava com medo”, conta Bietti, “e decidiu ficar na sala”.

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Bietti suspeita que Michelangelo passou estas semanas fazendo um balanço de sua vida e sua arte. Os desenhos nas paredes representam obras que ele pretendia terminar, bem como obras-primas que completou anos antes, incluindo um detalhe da estátua de David (terminada em 1504) e figuras da Capela Sistina (inaugurada em 1512). “Ele era um gênio. O que ele pode fazer lá [na sala]? Apenas desenhar”, aponta a atual diretora das Capelas de Médici.

Origem incerta

Como com qualquer arte sem assinatura e com séculos de idade, é impossível confirmar a origem dos desenhos com certeza absoluta. O consenso parece ser que alguns dos desenhos nas paredes são amadores demais para serem de Michelangelo. Mas a autoria do resto deles continua a ser uma questão de opinião.

Um esboço de uma forma masculina tem semelhanças com um posterior desenho a giz da Ressurreição de Cristo. Crédito: Paolo Woods/National Geographic

Após a descoberta de 1975, uma autoridade renomada da arte renascentista afirmou que a coleção de esboços seria um dos maiores achados artísticos do século XX. Mas William Wallace, um estudioso de Michelangelo na Universidade de Washington em St. Louis, é mais cético.

Wallace acredita que Michelangelo era proeminente demais para ter se escondido na sala e, ao invés disso, teria recebido abrigo de um de seus outros benfeitores. Ele também suspeita que os desenhos foram concluídos mais cedo, em algum momento da década de 1520, quando Michelangelo e seus muitos assistentes teriam tido uma folga de assentar tijolos e cortar mármore para a Nova Sacristia, que estavam construindo logo acima.

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O estudioso acha que vários dos desenhos podem ser originais de Michelangelo, mas outros tinham, provavelmente, sido feitos ​​pelos trabalhadores, que estariam tentando resolver dilemas artísticos ou que simplesmente se divertindo em suas folgas. “Separar um do outro é quase impossível”, diz.

Este esboço lembra a pose característica da estátua de Apolo-Davi, um trabalho inacabado atribuído a Michelangelo. Crédito: Paolo Woods/National Geographic

Ainda assim, ele acrescenta que o mistério de quem elaborou os desenhos não tira seu valor ou a importância da descoberta. “Estar nessa sala é empolgante. Você se sente privilegiado. Você se sente mais próximo do processo de trabalho de um mestre e seus alunos e assistentes”, relata. “Esta é uma pessoa que tinha capacidade infinita. Ele viveu até os 89 anos e nunca parou de melhorar”. [National Geographic]

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